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Como lidar com a falta de esperança após a derrubada de Dilma, a primeira mulher na presidência do Brasil?

Imagem: Fotos Públicas/Marcelo Camargo/Agência Brasil

Imagem: Fotos Públicas/Marcelo Camargo/Agência Brasil

Trinta e um de agosto de 2016. De livros de história a nossas vozes cansadas contarão essa história. Alguns por um viés chamado de neutro, que é sempre o que apoia o opressor, outros lembrando de como os avanços sociais correram riscos. Trinta e um de agosto de 2016 é um dia inesquecível. Porém não termina com ele a nossa esperança.

“Não desistam da luta, ouçam bem. Eles pensam que nos venceram, mas estão enganados. Sei que todos nós vamos lutar. Haverá contra eles a mais firme, incansável e enérgica oposição que um governo golpista pode sofrer”

É assim que se mantém a esperança em um futuro melhor: trabalhando para que ele venha. Nos últimos meses aprendemos talvez a lição mais importante das nossas vidas: nossas energias somadas se elevam à milésima potência.

Somos mais fortes do que gostariam que fôssemos. Temos mais foco do que eles esperavam. Nossa mente funciona com mais clareza sobre pressão.

Romantizar a ideia de mulher guerreira não nos faz bem, nos torna prisioneiras dessa lenda de que quando sofremos somos melhores, porém queríamos apenas não sofrer. Esse mito não é bonito, mas é o que temos nas nossas mãos nesse instante. Todas nós, mulheres, sofremos esse golpe.

Não é apenas sobre política, é sobre vidas, conquistas, direitos, lutas, lágrimas, suor e sangue. Sangue que, hoje, corre mais forte do que nunca em nossas veias e nos faz ter até vertigem frente ao futuro. O coração bate forte, mas não mais sozinho. Seu coração bate junto com o meu, em consonância com o coração de diversas outras mulheres que escolheram não aceitar. A esperança está aí: estamos juntas como nunca antes estivemos.

Somos animais e nosso instinto de sobrevivência nos permite feitos incríveis. É ele que deve nos guiar agora. Estamos no modo leoa e vamos rosnar a quem quer que tente nos tirar o que conquistamos com tanta dificuldade. E não estamos sozinhas.

“Nada poderá nos fazer recuar”

Depois de aprendermos que não é só uma parte do mundo que nos é de direito, que não devemos ficar restritas ao privado, o público se tornou nossa casa. Não voltaremos atrás. Não permitiremos que nos façam recuar. Deixamos de ser invisíveis aos olhos de quem tanto incomodamos, aqueles que têm o poder nas mãos, e conquistamos direitos que sempre nos foram negados. Não permitiremos que os levem.

Quando as forças conservadoras se unem para tentar barrar o progresso devemos ouvir o recado que eles tentam esconder de nós: as minorias estão mais fortes do que nunca, mais organizadas e lutando com mais chances por representatividade.

É um suspiro dado com muito esforço. É a união de forças que já não pareciam mais dar as caras. O Brasil é um país conservador, machista e misógino, mas pela primeira vez também é um país com medo da força que as mulheres e outras minorias ganham quando se olham com generosidade e entendem que temos muito mais em comum do que enxergamos até hoje.

A luta não para e a esperança está no olhar das mulheres que nos cercam, inspiram e dão forças para seguir. Não descansaremos até que o poder esteja, também, nas nossas mãos. Não daremos um passo atrás antes que as nossas estejam seguras.

Há esperança. Há luta. Há amor. Há determinação. Já estamos juntas, agora só precisamos nos organizar de verdade para mostrar isso ao mundo.

“Acabam de derrubar a primeira mulher eleita presidenta do Brasil sem que haja qualquer justificativa constitucional para este impeachment. Mas o golpe não foi cometido apenas contra mim, contra o meu partido ou os partidos aliados, que me apoiam hoje, isso foi apenas o começo. O golpe vai atingir indistintamente qualquer organização política progressista e democrática. O golpe é contra os movimentos sociais e sindicais. E contra os que lutam por direito em todas as suas acepções. Direito ao trabalho e a proteção de leis trabalhistas; direito a uma aposentadoria justa; direito à moradia e à terra; direito a educação, a saúde e cultura; direito dos jovens de protagonizarem sua própria história; direito dos negros, dos indígenas, da população LGBT, das mulheres; direito de se manifestar sem ser reprimido. O golpe é contra o povo e contra a nação. O golpe é misógino. O golpe é homofóbico. O golpe é racista. É a imposição da cultura da intolerância, do preconceito e da violência”

Não compactuaremos com o retrocesso.


Os destaques do texto são trechos do discurso da presidenta Dilma Rousseff após o resultado do processo de impeachment.


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Carol Patrocinio é jornalista e divide seu tempo entre escrever para diversas publicações sobre assuntos relacionados ao mundo feminino e ao feminismo, como o Ondda, seu canal no Medium e consultorias para negócios que querem falar com as mulheres.