Não há como negar, o trabalho, para nós mulheres, é uma corrida com (muitos) obstáculos.
Largamos atrás e quando cruzamos a linha de chegada que almejamos, com frequência foi à base de muitas coisas que deixamos para trás, que precisamos abandonar pelo caminho ou escolher — mesmo quando não queríamos.
Temos de nos virar nos 30, fazer malabares de todas as demandas. Se quisermos trabalhar e ter filhos, temos de pensar na licença-maternidade curta e no medo constante de ser demitida após regressar ao trabalho — uma pesquisa da FGV aponta que 48% das mulheres são mandadas embora depois da licença. Isso sem contar na desigualdade salarial, no fato de não conseguirmos tão facilmente galgar degraus na carreira e de termos sempre de nos mostrar infinitas vezes mais capazes do que os homens para conquistar as mesmíssimas coisas.
Como podemos ficar sãs, tamanha cobrança e exaustão?
“O Trabalhismo - a religião de uma geração que acredita que você-é-o-que-você-faz — foi um dos principais ingredientes para chegarmos ao atual e alarmante nível de esgotamento. Parece cilada? Mas muitos caíram. Simbolicamente e literalmente.” -
- trecho do Relatório Vibes do Trabalho, da agência float vibes.
A ilustradora Priscila Barbosa, que hoje é conhecida mundialmente, é uma das nossas histórias inspiradoras neste Especial de Autocuidado. Para ela, que vinha há quatro anos trabalhando na mesma agência de design, não é possível falar em ofício sem abandonar a questão de gênero intrínseca que está embutida na forma como somos vistas e tratadas.
Talvez por isso o autocuidado como ferramenta no trabalho seja uma cartada poderosa e revolucionária. Foi assim que Pri, por exemplo, conseguiu enfim abandonar um cargo que a consumia e se lançar no mundo como sua própria chefe. Para ela, a fórmula foi certeira: conseguiu visibilidade, está sempre com agenda lotada de trabalhos e, além disso, ganhou a liberdade criativa que queria para levar sua mensagem de ativismo e diversidade.
Apesar das conquistas mais visíveis a olho nu, é nas pequenas coisas que a ilustradora vê grandes ganhos: o compromisso de um café da manhã diário com calma; tempo para respirar com atenção plena no meio do trabalho; o fato de estar perto dos gatos e ter seu próprio cantinho.
Mas o caminho da Priscila representou seu próprio processo. Não há receita de bolo. Para entender onde nosso calcanhar de Aquiles aperta e para escutar nossas demandas mais genuínas, precisamos de silêncio.
O que, aí do outro lado, é mais urgente, quando vem a sua cabeça seu trabalho, sua carreira profissional? O que te desgasta e esgota, mas que ainda falta um assopro de coragem para que o autocuidado, nessa dimensão, vire rotina?
É preciso dizer um não ou um sim? É preciso colocar limites ou relaxar e permitir que a fluidez tome seu curso? É preciso sair? É o ambiente, os outros ou você?
Essas são algumas perguntas iniciais que podem servir para que a gente comece essa conversa de forma mais honesta. Seguimos juntas.
Gabrielle Estevans é jornalista, editora de conteúdo e coordenadora de projetos com propósito.