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#5 Prática: descobrindo crenças e modelos mentais

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Nessa primeira parte da trilha, focamos em olhar em volta. Passamos por estruturas patriarcais que vira e mexe oprimem, espremem: ideal de feminilidade, estereótipos de gênero, o amor romântico, preconceito, estigmas conectados ao comportamento feminino. Isso para a gente se situar, entender o contexto em que estamos coletivamente inseridas enquanto mulheres — não para gerar raiva, revolta ou para negarmos tudo o que há e as coisas como são.

Ao contrário: essa jornada toda é mais sobre consciência e acolhimento das nossas próprias necessidades do que qualquer outra coisa. Então, respira fundo.

Também, ao final de cada texto, propusemos uma prática. Através delas, é possível trazer o conceito amplo e social do texto para a nossa realidade individual e entender o que, daquilo tudo, decantou na nossa vida e como se manifesta. Então, se não teve tempo ou esqueceu de alguma prática, a gente aconselha que você volte lá quando puder — e antes de seguir com esse texto, fechado?

Agora, é hora de fazermos uma pesquisa interna um tanto mais profunda que as explorações prévias dos textos anteriores. Mergulhar de fato na nossa própria vida relacional, emocional, e desvendar crenças e modelos mentais que estão ali, presentes —  silenciosos — e que sustentam padrões que, muitas vezes, não sabemos de onde vêm. 

Essa prática vai te demandar um pouco mais de tempo de dedicação. Então, guarde para fazer assim que tiver 30 minutos disponíveis. Você também vai precisar de post-its (se não tiver, use papel A4 ou A3), caneta e canetinhas coloridas.

Pronta? Vamos lá.

Nossa sugestão de prática: Mapeamento Sistêmico

Vamos pensar nas nossas mentes como um iceberg. Uma partezinha do que existe se manifesta na superfície, é visível, mas a maior parte fica submersa, invisível. Quando nos propomos a olhar para todo o iceberg, estamos aumentando a nossa capacidade de entender, e consequentemente, de influenciar transformação. É isso o que vamos fazer em seguida.

Primeiro, vamos dar nome para essas partes, para desvendá-las: o que vemos, o que fica de fora, são eventos ou padrões. O que fica submerso tem duas camadas: a superior, mais rasa, são as estruturas. A mais funda e submersa são os modelos mentais. Assim:

 

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Evento é algo que aconteceu uma única vez. Por exemplo, uma onda. Padrão são eventos que se repetiram, como uma série de ondas. Estruturas são motivos pelos quais aqueles padrões se dão. Modelos mentais são as lógicas por detrás das estruturas.

Para ficar mais fácil, para descobrirmos cada um, podemos nos fazer as seguintes perguntas:

Evento: o que aconteceu exatamente?

Padrões: o que vem acontecendo com frequência?

Estruturas: Por que isso está acontecendo?

Modelos mentais: quais lógicas deixam isso acontecer? 

No nosso mapeamento, vamos ignorar os eventos e pular direto para os padrões. Mergulhando fundo até chegar nas crenças e modelos mentais. Vamos lá.

1. Mapeie padrões, estruturas e modelos mentais

Primeiro, pare. Faça algumas respirações profundas, relaxe o corpo. Pense que o tempo dessa prática é um tempo seu, de qualidade, amor, autocuidado. E não tem certo ou errado: seja lá como ela acontecer, vai ter sido importante.

Agora, você vai tentar mapear até 5 padrões, estruturas e modelos mentais, nessa sequência. Cada padrão identificado tem uma estrutura que o suporta, e um modelo mental por detrás. Você pode usar palavras e frases, mas os modelos mentais vêm sempre em forma de citação, ditados populares. 

Não esqueça de usar as perguntas acima, referentes a cada categoria, para serem suas guias.

Exemplo: 

Padrão: me envolvo, muitas vezes, em relações violentas.

Estrutura: medo de ficar velha e sozinha.

Modelo mental: "ruim com eles, pior sem eles"

Escreva cada um em um post-it, e, para ficar mais fácil de visualizar depois, escolha uma cor de canetinha para cada categoria (ex.: padrão é azul, estrutura é vermelho, e modelo mental é verde).

Tente chegar em cinco, mas se surgirem menos, tudo bem. Se surgirem mais, ótimo, siga em frente.

2. Monte o seu iceberg

 

O pensamento sistêmico é uma disciplina para ver todos. É um framework para enxergar interrelações ao invés de coisas, e para enxergar padrões de mudança ao invés de retratos estáticos. - Peter Senge

 

O mapeamento sistêmico é uma proposta um tanto racional para questões bastante humanas e emocionais, mas é exatamente essa combinação que pode ser bastante útil.

Agora, cole seus postits em alguma parede que tenha livre por aí, ou, se não tiver, na própria mesa, chão, ou em uma folha A4. Cole simulando um iceberg: modelos mentais todos juntos na base, estruturas no meio e padrões na ponta, visíveis. Tome seu tempo para fazer isso. As cores diferentes das canetinhas vão te ajudar a separar as categorias nessa hora.

3. Observe o seu sistema

 

Olhe para o seu iceberg. Cheque os padrões, e vá descendo, para as estruturas, até chegar nos modelos mentais. Leia tudo com calma. Se quiser fazer alguma correção, reescrever, re-categorizar, tudo bem, vá em frente. O mapeamento é seu.

Se achar que existem post-its que são similares, tem conexão ou falam da mesma coisa, coloque-os próximos um do outro. Isso pode facilitar a leitura e compreensão.

Depois que fizer o que achar que é necessário, siga contemplando o que surgiu no seu iceberg. Dê especial foco e atenção para as estruturas e modelos mentais. Eles revelam pilares sociais e crenças que, muito provavelmente,  são coletivos, culturais, e compartilhados por outras mulheres. Ao mesmo tempo, mostram um recorte bastante individual do sistema: os modelos mentais representados aí, no seu mapa, são crenças que estão em você.

Acolha-as. Está tudo bem.

4. Crie um mapa de calor

Por último, tente identificar quais são os pontos mais importantes do seu mapa. Vamos chamá-los de pontos de transformação.

De tudo o que você escreveu, de todos os post-its, de tudo o que brotou, o que te parece mais relevante? O que mexeu mais com você? O que se repetiu de forma surpreendente em mais de um post-it? Escolha de 2 a 3 post-its e faça uma bolinha vermelha neles.

Esse é seu mapa de calor. Você mesma acaba de se dar dicas do caminho mais importante: os post-its escolhidos trazem questões que valem a pena olhar, refletir, trucar, trabalhar.

Sempre com calma, acolhimento, tempo ao tempo.

Com essa prática um pouco mais complexa e intensa, fechamos a primeira fase da nossa trilha. Seguimos para a próxima etapa da jornada, de mundo interno, mais sutil e individual.

Te espero no fórum, sempre. Inclusive, se tiver dúvidas sobre essa prática, grita lá que todas respondem. Vamos juntas. :)


Anna Haddad é fundadora da Comum. Escreve pra vários veículos sobre educação, colaboração, novos negócios e gênero, e dá consultorias ligadas à comunidades digitais e conteúdo direcionado pra mulheres.