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#15 Prática: ao invés de autocrítica, motivação com compaixão

Na nossa relação com a comida, estão presentes, invariavelmente, uma montanha de questões. Uma delas tem a ver com prisões estéticas. Pra nós, é dado: nascemos fazendo uma conexão brutal entre comida e o nosso tamanho, a nossa aparência, o nosso peso na balança.

Temos explorado bastante disso na nossa trilha.

Essa experiência de comer sendo mulher nos nossos tempos e na nossa cultura é muito diferente da experiência de um homem: eles também lidam com as emoções através da comida (e do álcool e das drogas), mas somos nós que olhamos para ela com um peso dolorido de quem quer ser magra e bonita a todo e qualquer custo.

No documentário Embrace (disponível no Netflix), várias mulheres são entrevistadas sobre como se sentem com seus corpos. Muitas delas descrevem as próprias aparências como repugnantes e nojentas.

A opressão social em torno do nosso tamanho faz com que o ato de comer ganhe uma carga imensa. Fora isso — que compartilhamos todas por sermos mulheres — muitas outras questões individuais se apresentam ao longo da vida: diabetes, doença celíaca, crudivorismo, vegetarianismo, veganismo, escolhas alimentares e políticas das mais variadas.

Então, decidir colocar na boca isso ou aquilo, as quantidades e os desejos, trazem consigo uma tonelada de culpa, julgamento, e, com o passar do tempo, podem começar a fazer parte de uma dinâmica mental elaborada que construímos para dar conta do recado: comer vira premiação ("eu mereço, porque fiz tudo certo") ou punição ("eu mereço seguir assim, porque não consigo me controlar"), vira fuga dos sentimentos, vira parte de um conjunto de regras apertadas que estabelecemos para alcançar a tão sonhada imagem no espelho ou para cumprir as metas que nós mesmas nos estipulamos. Vira ortorexia, compulsão, distúrbios.

Estamos presas em uma roda onde comer traz milhares de armadilhas emocionalmente desgastantes. É um jogo desenhado para o fracasso: invariavelmente, vamos falhar.

E aí, quando "falhamos" — saindo da dieta, comendo uma lata de leite moça depois do jantar, ingerindo o dobro de calorias que nos disseram que era ideal para nós, comendo açúcar, carboidrato, proteína animal, ou deixando de cumprir qualquer outra regra posta — nos massacramos em um mar de repressão e autocrítica que não nos ajuda em nada a avançar, muito pelo contrário.

Mas e se pudesse ser diferente?

E se, em vez de vivermos nos controlando, oprimindo, julgando e, a cada frustração, nos punindo duramente, a gente pudesse desenvolver uma motivação mais gentil e compassiva?

O ponto não é sermos permissivas e indulgentes com nós mesmas e seguir fazendo coisas que nos causam mal. Pelo contrário. É encontrar um caminho mais doce e cuidadoso, acolhedor, de transformação.

Vamos lá?

Práticas sugeridas

Nessas práticas de meditação, a Carol Bertolino nos guia por depois caminhos diferentes da autocrítica: um de motivação pela autocompaixão, e outro do acolhimento total e irrestrito através de frases de bondade para nós mesmas.

Comece pela prática 1, de motivação pela autocompaixão. Tenha como foco, nessa prática, algum ato, atitude, ou traço seu relacionado à comida, ao seu corpo, a sua aparência.

Na segunda prática, de bondade amorosa, apenas siga as instruções da Carol livremente. Deixe vir o que vier.

Se nunca meditou antes, não se preocupe. Encontre alguns minutos sozinha, em um espaço onde se sinta bem, confortável e segura. Você pode se sentar numa cadeira, deitar ou sentar com as pernas cruzadas ou em posição de semi lótus (mais sobre as posições aqui). Não se preocupe com formalidades. O importante é você estar confortável. É importante também que esteja relaxada porém presente, atenta, protagonista do processo. Evite posições onde vá cair no sono. Respire, se entregue à prática, se conecte com você mesma.

Te espero no fórum pra contar como foi.

Boas práticas, amiga.


Anna Haddad é fundadora da Comum. Escreve pra vários veículos sobre educação, colaboração, novos negócios e gênero, e dá consultorias ligadas à comunidades digitais e conteúdo direcionado pra mulheres.